Tuesday 21 April 2009

Anabela

Semi-nua, deitou-se de costas na alcatifa felpuda no quarto. Com sorriso atrevido, puxou para cima o top transparente de renda negra, revelando os seus seios redondos e rosados. Depois, lentamente, puxou as cuequinhas para baixo, ficando a segura-las com os dedos dos pés, divertindo-se a esticar o elástico enquanto fitava Pedro com um ar maliciosamente inocente. Ele permanecia recostado no cadeirão, ar sério e perna traçada, cofiando o queixo enquanto contemplava aquela sedutora visão.

Anabela era a personificação da mulher perfeita para Pedro. Branca como a neve, roliça mas proporcional, longos cabelos ruivos compunham o quadro na perfeição. Picasso teria produzido uma outra obra-prima partindo deste modelo sem grande dificuldade. Mas o que mais atraía Pedro era o seu completo à vontade com o seu corpo nu. Intrigava-o o facto de nada do que fizessem dentro de quatro paredes, por mais imaginativo que fosse, lhe parecia alguma vez ordinário ou pornográfico, fluindo tudo com a maior naturalidade.

Rita, a sua mulher, estava em viagem e só regressava no dia seguinte. Aproveitando a oportunidade de estar só naquela noite, e depois de uns bons whiskies duplos sem gelo, resolveu entregar-se incondicionalmente aos prazeres da carne. Apesar de se encontrarem ocasionalmente, na maior parte dos casos sempre que Pedro viajava em negócios, Anabela nunca deixou de estar disponível para a satisfação de todos os desejos, mesmo os mais obscuros, e esta noite não foi excepção.

“Venha cá já seu menino mau” ronronou Anabela. Inebriado pelo quase imperceptível odor feminino, Pedro ajoelhou-se junto dela, e prontamente libertou o seu membro viril já erecto dos jeans que o sufocavam literalmente, sendo recebido com um olhar de simulado pudor e espanto.

A noite foi longa. Ofegante, Anabela deixou-se cair sobre a cama em contínuos espasmos acompanhados de exclamações de prazer entrecortadas. Pedro sentia-se exausto, dorido, mas apaziguado. Todavia Pedro não estava feliz. Na sua mente distante, revolviam-se agora outras ideias difusas e perturbadoras, mas o cansaço impedia-o de entrar em stress naquele momento, abandonando-se no torpor que o invadia lentamente. Aninhou-se em Anabela, e adormeceu profundamente.



“Pedro…” A voz aparecia-lhe quase inaudível, mas o seu som familiar começou a ecoar cada vez mais forte na sua cabeça. Os vapores dos excessos alcoólicos da noite anterior ainda lhe toldavam a razão, muito por culpa dos litros de wiskhy barato consumidos sem regra. Sobressaltado, ergueu-se num ápice, tentando melhorar com dificuldade a sua ainda turva visão. Rita estava encostada na porta do quarto de braços cruzados numa pose serena e face inexpressiva. Pedro tentou em vão controlar a aflição que lhe ruborizava as bochechas e lhe punha os olhos abertos como uma lebre em dia de abertura de caça.

“O que foi que se passou aqui?” A voz de Rita era pausada.
Pedro estava paralítico, na sua pose patética de miudo apanhado com a mão na caixa dos biscoitos.
“Por certo terás uma explicação para tudo isto, que vou adorar ouvir…”
Pedro queria falar mas as palavras morriam na garganta, asfixiando-o. Como justificar o injustificável. Nada o tinha preparado para este momento ao longo de toda a sua vida, apesar da sua longa e bem sucedida carreira de sedutor inveterado. Sempre se tinha safado impunemente às inúmeras vezes que pulara a cerca ao longo da sua relação com Rita, umas melhor outras nem por isso, mas ser apanhado em flagrante? Nunca lhe ocorreu semelhante pensamento, da mesma forma que não se pensa objectivamente na morte. Mas agora quase lhe apetecia tal sorte. Pelo menos a existência de um buraco onde pudesse desaparecer rapidamente seria muito bem-vindo.
“Rita…eu posso explicar” balbuciou de voz trémula.
“Duvido sinceramente que consigas explicar seja o que for nesse teu estado lastimável, Pedro, mas sempre podes tentar,” disse Rita sorrindo.
Pedro coloca as mãos em forma de prece.
“Não era a minha intenção, juro-te Rita, por tudo o que há de mais sagrado”
“Não era a tua intenção? Qual era então a intenção? Juro que não te estou a perceber.”
Pedro estava sem palavras, e a entrar em desespero.
Rita solta uma risada forçada. “Tinhas mesmo necessidade de fazer isso? De beber até ao coma alcoólico? de Fazeres essas figurinhas tristes que fazes sempre que te apanhas sózinho?”
Pedro estava petrificado, sem solução para o problema.
“ E sabes que mais? Eu agora não tenho pachorra para ouvir mais nada. Alem disso já estou atrasada.” desabafou. Rita olhou demoradamente em volta do quarto. A sua face revelava incredulidade. Não sabia se haveria de deixar tudo para trás, se partia para a ignorância e extravazava a raiva que a assaltava nesse instante. Optou por se acalmar. Tudo se resolveria mais tarde e a frio.
“Quero ver este quarto arrumado e impecável quando regressar, ouviste bem?! Não quero notar o mínimo sinal do que se passou aqui esta noite.”
O tom era perigosamente agressivo, mas simultaneamente ele pressentiu nessas palavras de Rita que nem tudo estaria irremediavelmente perdido. Havia ali uma réstia de esperança, quase nula, mas havia.

Antes que pudesse terminar este pensamento, Rita volta atrás, visivelmente irritada.
“E agradeço-te que tires a merda da boneca insuflável de cima da minha cama!”

1 comment:

Lilith said...

Interessante, esse teu imaginário.